"Mesmo que Berlim vai mudar, o euro será sempre insustentável". J. Ferreira do Amaral

A entrevista com o autor do best-seller "Porque Devemos Sair do Euro"

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"Mesmo que Berlim vai mudar, o euro será sempre insustentável". J. Ferreira do Amaral

di Alessandro Bianchi

João Ferreira do Amaral. professor catédratico do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) Universidade Técnica de Lisboa. Autor do livro "Porque Devemos Sair do Euro"

- Com o seu livro que se tornou um best-seller: " Porque Devemos Sair do Euro" foi capaz de quebrar um grande tabu na opinião pública em Portugal. Não o mesmo pode ser dito para os partidos políticos que dominam a vida política de seu país. Como podemos tornar este passo adicional?
 
Penso que um momento importante será o das próximas eleições europeias. Tenho a esperança que surjam partidos a propor a saída do euro. Ficaria muito satisfeito se tal sucedesse e creio que alguns desses partidos poderiam ter uma votação significativa.
 
- Antes de forçar uma ruptura na zona do euro, há quem aponta como os países do sul da Europa devem se unir e formar um cartel para forçar a Alemanha a fazer essas mudanças na política econmica necessárias para reanimar suas economias. Ainda há tempo para fazê-lo?
 
Em minha opinião não é uma questão de tempo. A moeda única é um projecto que não é sustentável porque causa clivagens insanáveis entre os estados europeus. Em particular, não permite que os países com economias menos competitivas possam crescer e criar empregos Por isso, a prioridade deve ser o desmantelamento controlado da zona euro ou a saída dos estados em pior situação. Uma mudança da política alemã, ao permitir algum crescimento nos países em situação mais difícil seria vantajosa para ajudar a que esse desmantelamento ou essa saída se fizessem da forma  mais equilibrada possível.
 
- A zona do euro – e o sul da Europa, em particular - está entrando em uma fase perigosa de deflação. Quais são os riscos envolvidos?
 
A deflação, em particular quando se trata de economias muito endividadas, como são em geral as da zona euro, é uma situação muito perigosa. A deflação desincentiva o investimento e torna mais difícil aos devedores suportar as dívidas, levando a retrair o consumo. Tal como a História nos ensina, uma economia que entra em deflação tem uma grande probabilidade de atravessar um longo período de estagnação ou mesmo de depressão económica.
Mas que outro resultado seria de esperar com as políticas de austeridade que têm sido impostas pelas instituições europeias?
 
- Em março de 2011, o Governo Português demitiu-se sobre a crise da dívida soberana, o Parlamento foi dissolvido eo ex-primeiro-ministro socialista José Sócrates declarou estado de insolvência, buscando a intervenção da
Troika. O Memorando de Entendimento, que exigiu dois anos e meio de austeridade para o país, foi, portanto, negociado na ausência das condições democráticos mais básicos. Como você julga o comportamento de Sócrates? E o país realmente precisava dessa intervenção?
 
Na situação em que o País se encontrava não havia provavelmente outra solução senão pedir ajuda externa. Porém, passada a fase mais aflitiva, ou seja no Outono de 2011 o novo governo deveria ter imediatamente iniciado negociações para moderar a austeridade e obter um alongamento do prazo do programa, uma vez que era visível que os objectivos não se iriam cumprir. A própria evolução negativa da economia europeia criava mais dificuldades ao programa e melhores condições para a negociação. Mas o governo considerou erradamente que a austeridade iria dar resultado. Não deu, e Portugal confronta-se actualmente com problemas que se agravaram muito, como o desemprego, ao mesmo tempo que a dívida pública continua a aumentar em proporção do PIB.
Há também, evidentemente uma enorme responsabilidade da Troika nesta situação.
 
Muitas vezes refere-se ao drama social da Grécia como uma realidade tão distante dos outros países do sul da Europa. Mas se considerarmos os dados sobre a pobreza relativa, o desemprego dos jovens e a desigualdade social,
percebe-se que não há muita diferença. Portugal está a chegar ao ponto de ruptura ou a situação social é muito diferente do grego?
 
A situação é diferente não em termos de tendência mas de estado a que se chegou. Ou seja, o caminho que Portugal está a trilhar é semelhante ao grego, mas não atingiu ainda, nem de longe, a proporção do desastre grego. Nomeadamente no que respeita à queda do PIB e ao aumento do desemprego.
Mas é evidente que se a austeridade se prolongar nos aproximaremos mais da Grécia. A catástrofe grega não tem a ver com a Grécia. Tem a ver com a política que a Troika impôs. O problema põe-se exactamente da mesma forma em Portugal.
 
- Ao contrário de outros países, Portugal ainda não conseguiu canalizar a dissidência contra as políticas de Bruxelas, Frankfurt e Berlim, em um partido politico ou no interior das instituições. Por que isso?
 
Alguns partidos, em particular os mais à esquerda, como o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda têm sido oponentes muito determinados às políticas da Troika. Mas na minha avaliação há uma enorme potencialidade ainda por explorar entre os eleitores portugueses no sentido de pôr em causa a própria moeda única. Os barómetros de opinião apontam claramente para uma evolução positiva nesse sentido.

- As eleições para o Parlamento Europeu em Maio próximo será um momento decisivo para o futuro sistema europeu. Em que partido ou movimento coloca mais confiança para iniciar um processo de mudança?
 
Neste momento não teria confiança em nenhum porque não nenhum propõe a saída do euro ou o desmantelamento da zona euro. Mas como disse no início tenho esperança que surja algum partido com esse objectivo. Se tal suceder votarei nele.

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